Participantes aprendem diversas técnicas de enxertia no viveiro da Fazenda São Nicolau (Foto: Saulo Thomas)

Participantes aprendem diversas técnicas de enxertia no viveiro da Fazenda São Nicolau (Foto: Saulo Thomas)

 

A oficina de enxertia em castanheiras-do-Brasil, realizada no dia 10 de setembro na Fazenda São Nicolau, recebeu o apoio da ONF Brasil, que organizou o evento e disponibilizou a estrutura da propriedade. Mas foi da Associação dos Coletores e Coletoras de Castanha-do-Brasil do PA Juruena (ACCPAJ) a iniciativa de intermediar o contato com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e solicitar a oficina como uma contrapartida à participação da associação em estudos sobre as castanheiras, quando os coletores serviram como guias para os pesquisadores identificarem matrizes de castanheiras. Em vez de receber diárias pelo serviço de guia na floresta, os membros da ACCPAJ solicitaram a realização de um treinamento sobre técnicas de enxertia para a comunidade local.

O principal objetivo da oficina foi compartilhar o conhecimento científico da instituição e os benefícios da pesquisa com a comunidade. Não é nova a participação dos coletores em estudos que aprimoram as práticas sustentáveis para o setor produtivo das castanhas. A parceria de longa data com a ONF Brasil, por exemplo, permitiu a confecção da análise técnico-econômica das cadeias de produtos florestais não madeireiros e na demarcação dos castanhais da São Nicolau.

Acompanhando e se envolvendo na produção de informações, os coletores perceberam, há algum tempo, a necessidade de plantarem os próprios castanhais para aumentar a autonomia do grupo em complemento com as parcerias com os proprietários rurais. A enxertia é uma técnica de união de 2 plantas para formar uma planta com melhores qualidades e pode ser utilizada para a implantação de castanhais comerciais. Com essa técnica, é possível aumentar a precocidade da produção de castanhas e multiplicar atributos positivos de um indivíduo de maneira homogênea.

O plantio de castanheiras com mudas enxertadas apresenta várias vantagens e pode aumentar a viabilidade econômica em plantios comerciais. A produção de castanhas ocorre mais rapidamente nas plantas enxertadas, podendo iniciar logo em 5 a 7 anos após o plantio (comparado com os 9 a 12 anos das plantas sem enxertos). Além disso, as castanheiras enxertadas mantêm as características genéticas da planta-mãe ou matriz, de onde foi retirado o enxerto, e, portanto, permitem alcançar uma uniformidade de indivíduos produtivos e seleção da variedade. Esse controle se torna interessante uma vez que os agrupamentos de castanheiras nativas possuem cerca de 40% de indivíduos não produtivos ou de baixa produtividade (segundo dados do mapeamento do castanhal da São Nicolau).

Nessas condições, o plantio de castanheiras enxertadas tem rentabilidade anual, em valores brutos por área, duas vezes superior em comparação à pecuária extensiva na região. Apesar do mercado consolidado e da vocação climática do Noroeste de Mato Grosso para a produção das castanhas, o retorno desse tipo de atividade ainda é de longo prazo. Uma opção interessante é o consórcio de plantio de castanheiras com a pecuária em áreas consolidadas para garantir a entrada de receitas até a produção das castanhas. É possível utilizar espaçamentos adequados e técnicas de proteção das mudas nos primeiros anos, sem prejuízo para nenhuma das atividades.

Entre os 20 participantes da oficina, estavam membros da equipe da ONF Brasil, colaboradores dos viveiros e técnicos da Secretaria de Agricultura dos municípios de Cotriguaçu e Nova Bandeirantes, agricultores do PA Juruena, do PA Nova Cotriguaçu e de Nova Bandeirantes, estagiários da Embrapa Agrossilvipastoril, técnicos de campo e beneficiários do Projeto Redes Socioprodutivas do Instituto Centro de Vida (ICV) e membros da ACCPAJ.

A doutora Aisy Tardin e a mestre Suzinei Oliveira, integrantes da equipe da Embrapa de Sinop (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Agrossilvipastoril), compartilharam, com os participantes, conceitos e diferentes técnicas de enxertia que podem ser aplicadas para a castanha-do-Brasil.

 

O grupo coleta material da planta-mãe para realizar o enxerto (Foto: Saulo Thomas)

O grupo coleta material da planta-mãe para realizar o enxerto (Foto: Saulo Thomas)

 

A oficina se dividiu entre uma parte teórica e outra prática. A palestra da equipe da Embrapa apresentou os conceitos e os passos relacionados à enxertia. Primeiro, é necessário produzir mudas de castanheira a partir de sementes coletadas na floresta nativa em árvores com características interessantes. Para receber os enxertos essas mudas devem chegar à idade de 8 meses a 2 anos para melhores resultados. Depois, deve ser selecionada a matriz entre castanheiras em produção que apresentam as características desejadas (a planta-mãe pode ser originária de castanheiras nativas ou de jardins clonais ofertados pela Empaer) para coleta de galhos e preparo dos enxertos. De preferência de agosto a outubro (período das primeiras chuvas), as mudas porta-enxertos recebem os enxertos.

Na etapa prática da capacitação, a demonstração da enxertia foi realizada pelo técnico agrícola e agricultor Amilton Castanha, que era o participante com mais experiência em enxertia em frutíferas. Além de apresentar as técnicas de borbulia e garfagem orientados na oficina pela Embrapa, Amilton ensinou a técnica de fenda lateral, aprendida com o seu pai e aplicada para enxerto em árvores frutíferas, também com o principal objetivo de adiantar a produção. Essa última técnica pode ser realizada em viveiro e assegura que a muda não se perca caso o enxerto não dê certo. Afinal, o índice de sucesso da enxertia em castanheiras é de apenas 35%.

A atividade em meio às mudas foi a oportunidade para os participantes, principalmente de Nova Bandeirantes e do Projeto de Assentamento Nova Cotriguaçu, escutarem a experiência sobre a germinação de sementes de castanheira de Francisco de Assis, viveirista na Fazenda São Nicolau.

Depois da oficina, o próximo passo é o estabelecimento de plantios com a separação organizada por enxertos, semelhantes a jardins clonais, nos centros de pesquisa e também em áreas de produtores que se interessem em produzir mudas enxertadas em larga escala. Essas ações facilitam o estudo do comportamento de cada variedade e auxiliam o processo de enxertia em larga escala.

Sem estes plantios organizados, a única forma de obtenção de material para enxerto seria a partir da coleta em mata nativa. Ou seja, permaneceria a necessidade de escaladores experientes para realizar a coleta de galhos no topo das castanheiras produtivas, dentro de florestas, a cerca de 50 metros de altura.

O estudo e o mapeamento dos castanhais nativos da Fazenda São Nicolau, em parceria com a ACCPAJ e o Instituto Centro de Vida (ICV), produz informações que permitem avaliar a produtividade dos plantios comerciais e também selecionar matrizes com bons atributos para essa atividade. Até o momento, foram mapeadas, na Fazenda São Nicolau, 455 castanheiras apresentando quatro variedades diferentes (Rosa, Cacau, Rajada, Mirim). A análise dos resultados do mapeamento também alerta para a pouca quantidade de indivíduos jovens encontrados nos castanhais, o que pode comprometer totalmente o extrativismo no próximo século.

Essas pesquisas somente são possíveis devido à parceria com os coletores de castanhas, aliando o conhecimento empírico (daqueles que acompanham a produtividade das castanheiras durante anos) com a análise científica e técnica destas informações. A Fazenda São Nicolau é um espaço ideal para fomentar o encontro entre essas diferentes formas de conhecimento.

 

Veja mais fotografias da oficina:

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Coletores de castanha, gestores públicos, técnicos e sociedade acadêmica participaram da formação (Foto: Vanessa Correa)

Coletores de castanha, gestores públicos, técnicos e sociedade acadêmica participaram da formação (Foto: Vanessa Correa)

 

A ONF Brasil participou da troca de informações que aconteceu durante o curso “Normas e Procedimentos para o Manejo Florestal Não Madeireiro”, realizado de 27 a 29 de março no Parque Estadual Massairo Okamura em Cuiabá, MT. A iniciativa foi da Coordenadoria de Conservação e Restauração de Ecossistemas (CCRE) da Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA-MT). Participaram do evento associações de coletores, gestores da Secretaria de Estado de Agricultura Familiar e Assuntos Fundiários (SEAF), engenheiros florestais, estudantes de graduação e mestrado.

O debate visa construir, de forma participativa, a regulamentação estadual para as atividades extrativistas no estado. Atualmente a inexistência de uma legislação específica significa insegurança para os coletores que já trabalham de forma organizada.

No final de 2017, foram realizadas audiências públicas para promover e ordenar a exploração de castanha-do-brasil, pequi, cumbaru, babaçu, entre outros. A partir de uma demanda antiga da Associação de Coletores de Castanha-do-Brasil do PA Juruena (ACCPAJ), datada de 2015, foi redigida uma minuta à Procuradoria Geral do Estado (PGE), no início do ano passado, solicitando a emissão de um parecer para modificar a Política Florestal de Mato Grosso (Lei nº 233/2005). A proposta é que os extrativistas elaborem, com o auxílio de um engenheiro florestal, um Plano de Manejo Não Madeireiro com a validade de 10 anos. Após uma resposta favorável da PGE, o parecer foi encaminhado à Casa Civil.

Durante o curso no Parque Massairo Okamura, a SEMA-MT atualizou os participantes sobre os trâmites do processo. Segundo Elton Antonio Silveira da Superintendência de Biodiversidade da SEMA-MT, a iniciativa se tornou um aprendizado, pois nunca havia recebido demandas que exigissem alterações legais, inclusive no que se refere à legislação tributária. Elton está a frente do Grupo de Trabalho que elaborou a minuta de lei e recebeu questionamento da Casa Civil sobre a quantia que deixaria de ser arrecadada a partir do momento que os grupos extrativistas ficassem isentos de taxas para protocolar as solicitações relativas aos planos de manejo na SEMA. Além disso, o órgão perguntou como a SEMA-MT solucionaria a perda de arrecadação futura correspondente. Essas informações foram sistematizadas e encaminhadas à Casa Civil.

De uma forma geral, o curso serviu como um intercâmbio entre os diferentes atores envolvidos na cadeia extrativista. A presidente da ACCPAJ, Veridiana Vieira, destacou, durante a sua apresentação no evento, a disposição em submeter, assim que possível, um Plano de Manejo Florestal Sustentável Não Madeireiro (PMFSNM) em parceria com a Fazenda São Nicolau.

Veridiana explicou que a regulamentação é um anseio da associação, gerando benefícios para os associados, proprietários de terras e o Estado. Esse último arrecadaria os impostos devidos pela circulação de mercadorias e poderia manter um controle mais próximo da realidade sobre a quantidade real da produção de castanha no Estado. Hoje os dados oficiais registram valores anuais de castanha próximos a apenas um quarto da quantidade que apenas a ACCPAJ coleta.

A atuação da ACCPAJ também foi relembrada quando o projeto Redes Socioprodutivas foi apresentado pelo Instituto Centro de Vida (ICV). Resultaram dessa parceria o trabalho de mapeamento de castanhais realizado na Floresta São Nicolau. Foram, então, lançados os vídeos sobre a oficina de mapeamento e também sobre a história da ACCPAJ.

Outros destaques da programação foram as palestras do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) – que sugeriu formações sobre extrativismo, agricultura familiar, coleta de sementes e restauro de áreas degradadas –, do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) – com seus canais de comercialização de produtos da sociobiodiversidade –, do engenheiro florestal M. Sc. Alexandre Ebert da CCRE – sobre a importância do Plano de Manejo para a conservação da castanheira Bertholletia excelsa e os serviços ecológicos que ela presta. A Secretaria de Estado de Agricultura Familiar (Seaf) – apresentou o programa REDD+ for Early Movers (REM), para o qual a ONF Brasil contribui como membro do conselho gestor https://www.cialispascherfr24.com/prix-cialis-generique-en-pharmacie/ pelo Fórum Matogrossense de Mudanças Climáticas e que poderá apoiar o fortalecimento do extrativismo no estado, visto como umas das principais atividades que atribuem valores econômicos e sociais à floresta em pé. As apresentações foram encerradas com uma fala de um auditor sobre a interpretação legal das relações de trabalho entre associação de coletores e proprietários das áreas de coleta.

“O curso foi importantíssimo para que todos os atores que trabalham com produtos não madeireiros continuem se preparando para entrar nesta nova porta que a equipe responsável da Sema está empenhada em abrir, destacando a sua preocupação de facilitar os procedimentos de forma que eles sejam totalmente acessíveis às comunidades”, comentou Saulo Magnani Thomas, engenheiro florestal do Programa de Integração Local da ONF Brasil, que participou das atividades.

A regulamentação da atividade agroextrativista, que deve se iniciar no próximo ano, poderá agregar valor às atividades tradicionais do estado, promovendo benefícios para as comunidades e para a conservação das florestas.