29
maio
2015
A humanidade é muito privilegiada. E não se dá conta disso. Ou então, simplesmente acha que não há nada demais nisso. Mas Antonio Nobre nos convida a refletir. Nosso habitat, a Terra, é uma bola de pedra, que gira no espaço. Um espaço que não é nada hospitaleiro. O ser humano não conseguiria sobreviver em qualquer outro planeta. Somos uma improbabilidade estatística. “A Terra nos protege deste espaço, mas o lugar onde existimos é imensamente frágil. Infelizmente temos nos comportado como se nosso planeta fosse infinito”. E ele não é.
Antonio Donato Nobre é um dos pesquisadores brasileiros que sabe, como poucos, falar sobre ciência de maneira clara e contundente. PhD em Earth System Sciences, pela University of New Hampshire, nos Estados Unidos, e cientista do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), foi o palestrante convidado desta semana da série sobre Mudanças Climáticas: rumo a um novo acordo globalque vem sendo realizada pelo programa Invenções do Contemporâneo da CPFL-Energia, em Campinas, com curadoria do Planeta Sustentável*.
Autor do estudo O Futuro Climático da Amazônia, lançado no final do ano passado, o pesquisador falou na semana passada sobre Tesouro de vida na Amazônia: tecnologia verde a serviço do clima amigo.
Para Nobre, não cuidamos daquilo que não conhecemos. Tem sido assim com o planeta e também com a Floresta Amazônica. “Esta é uma característica do comportamento da civilização moderna. Não respeitamos o que não conhecemos ou não temos consciência de sua existência. Já os indígenas, respeitam o desconhecido e o sagrado”.
Foram necessários 4 bilhões de anos para que a natureza se formasse na Terra. E outros 50 milhões de anos para que a Floresta Amazônia ficasse em pé e sua imensa biodiversidade nascesse. Mas sem dó nem piedade, temos derrubado árvores e mais árvores para plantar soja ou criar gado para termos carne em nossas mesas.
Entretanto, ao acabar com a floresta e seus microscópicos habitantes, estamos matando mihares de seres vivos que possuem tecnologia e arquitetura invisíveis e fenomenais, que, segundo Nobre, jamais qualquer máquina criada pelo homem virá a ter.
Em somente um hectare da Floresta Amazônica existem cerca de 300 espécies de árvores. Em cada copa, há milhares de besouros. Em um única folha, aproximadamente 3 milhões de bactérias. “Mal conhecemos este pequeno cosmos da Amazônia. Existe uma imensa tecnologia oculta na biodiversidade da floresta”, salientou o cientista.
Mas como ainda não tomamos consciência disso, seguimos desmatando e degradando os ecossistemas terrestres. Para Nobre, ocorre uma alarmante “falência múltipla dos órgãos” do planeta, em uma analogia com o corpo humano e fazendo referência aos efeitos das mudanças climáticas. “Há mais de 20 anos a ciência fala nisso. Ou entendemos o sistema ou seremos devorados por ele”, alertou.
Antonio Nobre defende que haja um esforço de guerra contra a ignorância sobre a Floresta Amazônica. O imenso oceano verde, como ficou conhecida, é responsável pela regulação do clima no país. Só temos um clima tropical nesta faixa territorial, por causa da vegetação da floresta. Outras regiões do planeta, alinhadas geograficamente com o norte brasileiro, são desertos. A presença das árvores favorece a precipitação de chuvas. Sem elas, enfrentaremos extremos climáticos. “A árvore é um ser extremamente tecnológico e precisamos entender isso”, afirmou. “A Floresta Amazônica é insubstituível”.
Atualmente, 47% da floresta está degradada. Se será possível recuperá-la, o pesquisador não tem certeza. Mas acredita que a interferência humana pode ser sustentável. Hoje, agricultura é sinônimo de floresta destruída, mas não precisa ser assim. Cita, como exemplo, as civilizações indígenas e incas que viveram durante séculos na região e empregaram tecnologias avançadíssimas para a construção de estradas e barragens e, ao mesmo tempo, preservaram e respeitaram a floresta.
A contribuição da ciência também é fundamental para a conservação da Amazônia. “A quantidade de informação e soluções sem uso dentro da academia é enorme”, afirma. Todavia, a sociedade precisa compreender o que os cientistas fazem e dizem. “Não dá para falar de mudanças climáticas só usando a lógica. Precisamos falar com a sensibilidade das pessoas”, conclui.
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